sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

"MARIA ADELAIDE COELHO DA CUNHA - DOIDA NÃO E NÃO" MANUELA GONZAGA - LEITURAS 2020 - III



A prepotência, a malvadez, a tirania estão bem expressas neste excelente documento muito bem escrito por esta autora que eu desconhecia (Manuela Gonzaga). Aqui são retratadas e postas a nu figuras preponderantes da alta sociedade da época e que encaixavam em si a malvadez, que com o seu poder conseguiram (à força) internar num manicómio uma mulher saudável de corpo e mente. Para grande espanto meu (ou não) uma dessas pessoas foi o nosso primeiro Nobel, o Dr. Egas Moniz que juntamente com os poderosos alienistas da época (médicos especializados em doenças mentais) Júlio de Matos e Sobral Cid, assinaram, a troco de privilégios (de classe) e monetários, um documento comprovando a loucura desta mulher, utilizando, entre outros, o argumento climatério (idade crítica) para declarar Maria Adelaide Coelho da Cunha "degenerada hereditária, na qual se vem manifestando em relação com a menopausa, graves perturbações dos afectos  e dos instintos que a privam e capacidade civil para reger a sua pessoa e administrar os seus bens."

Os factos relevantes têm início em Novembro de 1918: era uma vez uma senhora muito rica (Maria Adelaide Coelho da Cunha, filha mais velha e herdeira do fundador do Diário de Notícias, o jornalista Eduardo Coelho) que fugiu de casa, trocando o marido, escritor e poeta, por um homem (Manuel Cardoso Claro) que, ao contrário do rude e déspota do marido, sempre a tratou digna e carinhosamente, com consideração e amor. Tinha quarenta e oito anos, pertencia à melhor sociedade portuguesa. O homem com quem esta senhora se mudou, de um palácio lisboeta para um modestíssimo andar em Santa Comba Dão, tinha praticamente metade da sua idade e fora seu motorista particular. 

É mais do que um livro é um documento comprovando excelentemente aonde poderá chegar a prepotência de certas pessoas poderosas que usam o seu poder para levar por diante os seus infames objectivos. E é, acima de tudo, o testemunho da vontade indómita de uma mulher que tudo arriscou por amor. 

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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

"ÚLTIMO CADERNO DE LANZAROTE" - JOSÉ SARAMAGO - LEITURAS 2020 - II

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Já me tinha deliciado com os cinco volumes dos "Cadernos de Lanzarote" - este, embora no título não tenha a indicação de que seja o 6º. volume, creio que se insere na categoria dos referidos cinco e poder-se-à considerar como o sexto dos Cadernos de Lanzarote.  Ao título ainda se acrescenta um chamamento "o diário do ano do Nobel", que é mais um apelativo para a sua leitura.

Gosto de diários e devo salientar que os referidos cinco volumes dos "Cadernos de Lanzarote" estão dentro daqueles belos livros, bela escrita do nosso Prémio Nobel.
E este "Último Caderno de Lanzarote" também tem o "selo" do grande escritor, integrando este relato diarístico elementos da agenda do escritor, artigos da revista Visão, cartas e discursos sobre a sua obra.

Os sublinhados são quase uma constante nos livros de Saramago, e este não escapa, por exemplo: 

-"O tempo tem razões que os relógios desconhecem, para o tempo não existem o antes e o depois, para o tempo só existe o agora", ou 

-a referência à matança de Acteal, ocorrida em 22 de Dezembro de 1977, e consistiu na chacina de 45 indígenas no estado mexicano de Chiapas (estado do sul do México, na fronteira da Guatemala, que não poupou crianças nem velhos nem mulheres)

-o urinol, que alguém considerou como uma obra de arte, a que Marcel Duchamp deu o nome de Fonte (dupla contradição: sendo, como é, receptáculo um urinol é precisamente o contrário de uma fonte).

E muitas, muitas outras referências a situações que desconhecia e que, repito, me deliciaram.


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José Saramago  -  1922-2010

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