sábado, 26 de setembro de 2020

"LÉAH E OUTRAS HISTÓRIAS" - JOSÉ RODRIGUES MIGUÉIS - LEITURAS 2020 - XVIII

 


Esta foi uma releitura, já que o havia lido pela primeira vez em 1986 (na última página de cada livro que acabo de ler anoto a data de início e do fim bem como a opinião sobre o que acabei de ler, gostei, não gostei, etc...). 
Obviamente que já não me lembrava absolutamente de nenhum dos contos deste livro, editado em 1982. 

São dez contos interessantes, sem nenhuma ligação temática entre eles, escritos por um autor que conhecia perfeitamente a língua portuguesa, apesar de ter vivido a maior parte da sua vida no estrangeiro. Morou na Bélgica, no Brasil e nos Estados Unidos. 

O primeiro conto, "LÉAH", conta a história de um português que vai trabalhar para Bruxelas ficando hospedado numa pensão, onde se apaixona pela figura enigmática da camareira LÉAH.

Os outros contos são "Uma viagem na nossa terra", uma viagem com personagens que nos relatam um tempo de lembranças que já não existem, numa viagem entre o Porto e Lisboa e que retrata bem os dramas pessoais dos seus personagens (dois casais).

"Pouca sorte com barbeiros" - numa Lisboa que também já não existe. Naqueles tempos as barbearias ainda eram, quase como os cafés, um centro de convívio.

Em suma, um livro que nos ajuda a perceber que José Rodrigues Miguéis foi um grande escritor da língua portuguesa e que parece absolutamente esquecido, um escritor que, apesar de ter vivido quase sempre fora de Portugal é realmente um dos contistas mais relevantes da língua portuguesa.

    


José Rodrigues Miguéis

9-12-1901, Lisboa
27-10-1980, Nova York


José Rodrigues Miguéis nasceu em Lisboa em 1901 e morreu em Nova York-EUA. em 1980.
Em 1924 formou-se pela Faculdade de Direito de Lisboa. 
Advogou, foi professor do ensino secundário, presidente da Segunda Liga da Mocidade Republicana e co-diretor do jornal O Globo
Licenciou-se em Ciências Pedagógicas, na Universidade de Bruxelas, em 1933. 
Em 1935 mudou-se para os Estados Unidos, assumindo o cargo de redator-associado das Seleções do Reader's Digest e, posteriormente, o de professor universitário. Foi um dos jovens que integraram a revista Seara Nova (1922). Escreveu contos, novelas, romances e peças de teatro. Apesar de quase toda a sua produção ter sido escrita longe da pátria (o que explica a sua preferência pelos temas do exílio e da emigração), manteve o humor delicado, a simpatia humana e o lirismo tipicamente portugueses. Obras principais: Páscoa Feliz (1932, Prêmio Casa da Imprensa), Onde a Noite se Acaba (1946), Saudades para Dona Genciana (1956), Leah e Outras Histórias (1958, Prêmio Camilo Castelo Branco), A Escola do Paraíso (1960), O Passageiro do Expresso (1960, peça de teatro), Gente de Terceira Classe (1962), É Proibido Apontar (1964) e O Milagre Segundo Salomé (1975).


Sublinhei:

(pág.148)  -  "Eu conheço-me bem: indeciso por temperamento, sempre que formo uma resolução, tenho de passar logo do pensamento ao acto. A ansiedade da expectativa destrói-me! Não será por isso a indecisão a fonte dos meus impulsos de audácia?"



3,5 - interessante

0 - li, mas foi zero
1 - desisti
2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
5 - muito bom
6 - excelente
7 - obra prima

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

MIGUEL TORGA - Diário Vol. XIII e XIV - LEITURAS 2020 - XVII



 Miguel Torga - Diário Vols. XIII e XIV - à venda - Livros, Lisboa ...


Miguel Torga completaria o 113º. aniversário do seu nascimento (hoje - 12.08.2020). 

Desde o princípio deste ano (2020), que se assinalam os 25 anos da sua morte.

Os diários de Miguel Torga foram publicados originalmente em edição do autor, em 16 volumes, entre 1941 e 1993.

Este diário que acabo de ler, inclui os volumes XIII e XIV, revela-nos o homem rude mas muito sensível e um escritor que nos maravilha (diz ele na página 226- Viram sempre em mim o que eu menos era-.) 

Neste livro, tal como nos diários anteriores são narrados factos interessantes não só do seu dia a dia mas também factos da vida social e política portuguesa de então, e não só...

Gosto de diários! Não sendo este o melhor do Torga (dos que já li) lê-se no entanto com muita curiosidade e, passe o eufemismo, principalmente porque é um livro que se vai lendo e não "obrigatoriamente" de seguida.

Curiosamente, neste tempo de pandemia Covid 19, eu que pensava que poderia ler mais foi precisamente  quando li menos.

Quando algo nos preocupa penso que o nosso sub-consciente revela inquietação e baixo nível de concentração, nomeadamente para a leitura.

Miguel Torga foi na realidade um grande escritor e foi mais um livro dele que esteve ao nível das minhas expectativas.  


Biografia de Miguel Torga - eBiografia


 

sublinhei:

-pág.215 -  Mas quem me lê, se ler bem, há-de ver que, desde os primeiros livros, só tenho tido um objectivo: ser mais fiel à minha verdade do que à minha imagem e dizer tudo sem nada explicar.  

-pág. 78 - Existir não é fácil. É preciso perder diariamente a memória das más horas e renovar diariamente a esperança das boas.  



3,5 - interessante

0 - li, mas foi zero
1 - desisti
2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
5 - muito bom
6 - excelente
7 - obra prima

  

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

"TERCEIRO LIVRO DE CRÓNICAS" - ANTÓNIO LOBO ANTUNES - LEITURAS 2020 - XVI

Terceiro Livro de Crónicas - Livro - WOOK

Ler um romance de António Lobo Antunes requer da minha parte alguma coragem que ainda não consigo ter.

Eu que tanto gostei dos seus três primeiros livros ("Memória de Elefante", "Os Cus de Judas" e "Conhecimento do Inferno) não consegui passar para além da pág. 50 do "Fado Alexandrino". 

Estará António Lobo Antunes na galeria de Marcel Proust e de James Joyce, escritores conhecidos como dificílimos? Os anos o dirão; é que, apesar de tanto Proust como Joyce continuarem a ser escritores difíceis eles continuam na galeria dos grandes escritores.

Devo, contudo, confessar que as crónicas de António Lobo Antunes, tanto as publicadas em jornais e revistas como em livro, sempre as li com muito interesse, como foi o caso deste terceiro volume de crónicas, embora nunca atingindo a fase do entusiasmo, mas descubro sempre nalgumas das suas crónicas o homem solitário, um homem que nasceu para escrever!  
                                     
Novo livro de Lobo Antunes 'A Outra Margem do Mar' publicado em ...
                                                        António Lobo Antunes - Lisboa  1942


sublinhei:

-pág.40 -  Não consigo gostar de uma pessoa que não respeite e admire 

-pág. 177 - Scott Fitzgerald sustentava que não se pode fazer a biografia de um escritor porque ele é muitos 

-pág.193 - Depois percebo que não há nada mais chato para os outros do que um homem que não se chateia

-pág.267- Leonardo da Vinci apresentava-se dessa forma; Leonardo, iletrado



3,5 - interessante

0 - li, mas foi zero
1 - desisti
2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
5 - muito bom
6 - excelente
7 - obra prima


quarta-feira, 10 de junho de 2020

"APARIÇÃO" - VERGÍLIO FERREIRA - LEITURAS 2020 - XV


"Aparição" será porventura um dos livros mais conhecidos do grande filósofo e existencialista Vergílio Ferreira. Reli-o agora e como o tinha lido já há muitos anos esta foi como se fosse uma primeira leitura, mas, se agora me foi de leitura difícil calculo o que teria sido há uns anos atrás... 

E que retirei desta releitura? - confesso que o achei um livro pesado com ambientes pesados, personagens pesados, embora muito bem retratados para a época em que o enredo decorre, na década dos anos 50 do século passado, na então provinciana cidade de Évora. 

Realmente um livro com uma estrutura difícil, intensa, diria até desconcertante e, por consequência, de leitura nada fácil. 

Personagens e ambientes que se vêem perfeitamente que são de outra época e que fazem do livro, um livro não diria ultrapassado mas um livro de estrutura complexa, e até de difícil compreensão, embora não deixe de reconhecer que possa ser até considerada uma obra de grande interesse filosófico do grande existencialista Vergílio Ferreira. 

Pareceu-me que serão registos autobiográficos já que uma das personagens principais dá aulas em Évora, tal como aconteceu com o escritor.  

Vergílio Ferreira é, para mim, fundamentalmente um homem do "CONTA-CORRENTE"- a sua grande obra!

Dizia Vergílio Ferreira no seu Conta-Corrente II: "o que importa num Diário não é o que acontece mas a maneira como se faz acontecer".

Creio realmente que a sua grande obra são aqueles seus diários, 9 volumes em que nos dá a conhecer Portugal e os portugueses (e não só) entre 1980 e 1994. Esta sim é, para mim, a sua grande obra. 

Atrevo-me a dizer que todos os outros seus livros se irão, a pouco e pouco, esfumando com o decorrer dos anos, tal como tem acontecido com outros grandes escritores que já ninguém lê e que estão praticamente esquecidos.  

Este "APARIÇÃO" soube-me a um livro fora do seu tempo e da sua época (se isto se poderá dizer de qualquer livro), daí ter terminado a sua leitura "sem honra nem glória" (entre aspas, claro).  

Vergílio Ferreira costumava dizer que ler dá muito trabalho e este é um dos seus livros que dá efectivamente muito trabalho, pois, nas entrelinhas, haverá muita coisa que, acredito, ainda não consegui alcançar.



Aparição", de Vergílio Ferreira
Vergílio Ferreira  -   Melo (Gouveia)  - 1916-1996


sublinhei:

-pág.25-  A verdade de um curso não está no que aí se aprende mas no que disso sobeja 

-pág. 111 - Ser anti é correr ainda o risco de ser pró

-pág.215 - A surpresa só o é uma vez

-pág.271- Um tirano só é grande aos olhos do cobarde



3 - razoável

0 - li, mas foi zero
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2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
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6 - excelente
7 - obra prima




domingo, 24 de maio de 2020

"OS CAVALOS TAMBÉM SE ABATEM" - HORACE McCOY - LEITURAS 2020 - XIV

Pin on Books + Book Covers

Este é um excelente retrato dos Estados Unidos da América nos terríveis anos 30 da Grande Depressão, em que uma imensa maioria da população carecia de uma vida digna sofrendo com o desemprego.

Toda a obra se desenrola no interior de um recinto onde decorre uma maratona de dança, em que ganha o último par a ficar em pé, e que acumula toda a sorte de miseráveis e desesperados que de uma forma verdadeiramente inumana testam ao extremo a sua resistência em troca de comida, roupas e do prémio mais desejado (1.500 dólares) que, certamente, seria na altura uma avultada quantia. 

Neste pequeno relato está contido todo o desespero e toda uma luta de competição entre desesperados que ainda procuram uma chance talvez, quem sabe, em Hollywood, dado que, durante a maratona lhes é anunciado (aos concorrentes) que estarão nas bancadas a assistir muita gente ligada à meca do cinema. nomeadamente alguns realizadores influentes na indústria.

O que me empurrou para a leitura desta pequena novela de 165 páginas (perdido nas prateleiras há mais de 20 anos) foi o já ter visto, há muitos anos na TV, o filme, creio que com uma excelente interpretação da Jane Fonda. 

Confesso que este é um daqueles livros em que gostei mais do filme já que, embora à distância, me pareça que o filme expressa melhor todo o sofrimento e todos os sentimentos daqueles desesperados. Neste sentido, o livro ficou aquém das minhas expectativas. 


   
Horace McCoy | Artista | Filmow
Horace McCoy  -   EUA   1897-1955

3 - razoável

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2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
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4 - bom
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segunda-feira, 18 de maio de 2020

"DIÁRIO Vols. XI e XII" - MIGUEL TORGA - LEITURAS 2020 - XIII


Mito de Sísifo: Diário Vols. I e II - Miguel Torga

SE CANTASSE

Se cantasse, talvez o coração
Sossegasse no  peito.
Mas vou perdendo o jeito
De cantar.
A vida, devagar,
Leva-nos tudo,
E deixa-nos na boca o gosto de ser mudo.

-Miguel Torga era de pedra por fora mas de algodão por dentro-

Gosto de ler diários e memórias de escritores e estes Diários, Vols. XI e XII, de Miguel Torga são um manancial de memórias, de literatura, de poesia e de muitos outros aspectos da vida portuguesa; e que bem os relata este grande escritor português!

Como se sabe, Miguel Torga é o pseudónimo literário do médico Adolfo Correia da Rocha.

Nasceu em S. Martinho da Anta (Trás-os-Montes) em 12 de Agosto de 1907 e faleceu em Coimbra em 17.01.1995.

Aos dez anos foi para uma casa apalaçada de familiares, no Porto, onde é um criado para todo o serviço. Contudo, devido à sua insubmissão, foi despedido um ano depois.

Teve seguidamente uma breve passagem pelo Seminário de Lamego mas não querendo ser padre, como disse ao seu pai, emigrou aos treze anos para o Brasil tendo aí trabalhado numa fazenda de café do tio, em Minas Gerais, até aos dezoito anos, O tio, querendo compensá-lo por estes anos de árduo trabalho, dispôs-se a pagar-lhe os estudos e por isso regressa a Portugal licenciando-se pela Faculdade de Medicina, em 1933.  

E em Coimbra exerce clínica durante mais de seis décadas.

Publicou mais de cinquenta livros e foi várias vezes indicado para o Prémio Nobel da Literatura.

Gosto dos seus diários pois em todos, os que li até agora, se afirma, de modo mais ou menos explícito, a vontade de preservar a pureza do ambiente natural.

Nos seus Diários (publicados de 1941 a 1987), estes vols. XI e XII, entre 1968 e 1977, encontramos, em prosa e em verso, admiráveis textos de variada espécie: reflexões culturais do mais longo alcance, lúcidos e pungentes instantâneos de vida quotidiana; corajosas tomadas de posição no campo ideológico; fulgurantes análises da alma e da paisagem portuguesas; apontamentos de deambulações além-fronteiras; belíssimos poemas (como o que acima reproduzo). 

Em suma, é sempre um prazer a leitura dos diários deste grande escritor e grande poeta português, e estes Vols. XI e XII não foram excepção. 

Foi, entre muitas outras honras, distinguido com o Prémios Camões em 1989.


Língua Portuguesa: 10 brilhantes poemas de Miguel Torga | VortexMag
Miguel Torga  -  1907 - 1995
  

sublinhei:

-(pág.23)   -   Leve tudo a sério na vida, mas não se leve a sério a si

-(Pág.35)   -  As pessoas confundiram no meu temperamento modéstia com orgulho, pudor com egoísmo, franqueza com agressividade, desinteresse com estratégia.



3,5 - interessante

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quinta-feira, 30 de abril de 2020

"COMO UM ROMANCE" - DANIEL PENNAC - LEITURAS 2020 - XII

Como Um Romance - Livro De Bolso

"Como um Romance" - delicia-nos a contrariar todas as ideias feitas sobre o prazer de ler e sobre os valores da escrita.

É sublinhado neste livro delicioso, de capítulos curtos e de apenas 180 páginas, que a leitura deve ser um prazer e os leitores de hoje têm de usufruir de alguns direitos inalienáveis.

A profunda originalidade de "Como um Romance" está na forma ao mesmo tempo muito divertida e muita séria com que o autor aborda a questão central de que dependem tanto o destino do livro como o destino da cultura e da educação. 

Claro que muito haveria para dizer sobre o viciado em livros, que não só gosta de livros como os admira na estante, folheia-os com regularidade, obviamente que, como dizia Eduardo Prado, certamente mais de 70% dos livros que possui ainda os não leu. 

O viciado em livros, normalmente possui vários exemplares de vários títulos, adora falar dos livros que acaba de ler. 

Mas nem só de livros vive o bibliófilo, ele também junta marcadores de livros, não os colecciona, junta-os. 
O bibliófilo adora fazer listas, dos livros lidos, dos livros não lidos, dos que pretende adquirir, mas fica muito chateado quando começa a ler um livro no qual depositava muitas expectativas e o não consegue acabar largando-o com a intenção de mais tarde o recomeçar (o que raramente acontece).

Eis, segundo Pennac, em matéria de leitura os direitos do leitor:
  1. O direito de não ler
  2. O direito de saltar páginas
  3. O direito de não acabar um livro
  4. O direito de reler
  5. O direito de ler não importa o quê 
  6. O direito de amar os "heróis" dos romances
  7. O direito de ler não importa onde
  8. O direito de saltar de livro em livro
  9. O direito de ler em voz alta
  10. O direito de não falar do que se leu
É um livro para todos os que gostam de ler e também para os que não gostam!


Daniel Pennaccioni, Pennac, romancista | Trocando em Miúdos
Daniel Pennac - Casablanca-Marrocos  1948


sublinhei:

-(pág.56)   -   geralmente conseguimos mais depressa e com mais garantias, o que não nos apressámos em obter.



3,5 - interessante

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terça-feira, 21 de abril de 2020

MARYA UMA VIDA - JOYCE CAROL OATES - LEITURAS 2020 - XI


Xis.pt

Poucos se podem igualar a esta escritora americana em intensidade, profundidade e paixão. Esta é uma qualidade, um dom que sempre me maravilhou nos seus livros.

Um fatídico incidente, nunca completamente esclarecido, deixa Marya orfã de pai e desamparado face ao comportamento irresponsável de uma mãe alcoólica que depois a abandona. Este acontecimento converte-se num ponto de referência fundamental na vida de Marya: nada será jamais tão intenso como a força dessa recordação.

Adoptada pelos tios, irá crescendo com ela uma aguda consciência de hostilidade do mundo, a violenta e marcante iniciação sexual (forçada) com o seu primo Lee.

O reencontro com a mãe muitos anos mais tarde, surge a Marya como um ponto aberto à esperança, um desafio inevitável, o risco que tem de correr para conseguir libertar-se dos seus conflitos interiores  —este reencontro, para grande pena minha, é assunto que, penso eu, deveria ser abordado com mais intensidade e não ao de leve como realmente aqui acontece —  

Romance de carácter marcadamente autobiográfico, Marya Uma Vida (1986) é uma comovente recapitulação da história de uma verdadeira heroína dos tempos modernos, de uma infância humilde e obscura até à sua consagração como intelectual brilhante.

Aquilo de que mais gosto nesta escritora está neste livro, já que Joyce Carol Oates envolve-nos no seu universo particular de uma América povoada de monstros, alucinada pelo sangue, pelo crime e pela rejeição. Este clima das gentes da profunda América é fascinante.

Joyce Carol Oates - grande escritora!

Joyce Carol Oates - Joyce Carol Oates promove "Palavras do autor para viver perto" de CAROLEE
Joyce Carol Oates - Lockport - Nova Iorque  1938

retive:

 (pg. 214) - "Sabiam, por exemplo, que a mulher de Freud, Martha, era uma dona de casa e do marido tão compulsiva, tão atenta ao seu génio a ponto de lhe pôr todos os dias a pasta de dentes na escova"



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sábado, 11 de abril de 2020

"TEMPO DE CATANAS" - JEAN HATZFELD - LEITURAS 2020 - X

Tempo de Catanas - Livro - WOOK


Entre Abril e Julho de 1994, foram massacrados no Ruanda 800.000 tutsis —homens, mulheres e crianças — retalhados até à morte, uma a uma, pelos hutus.
Foi um genocídio que seguiu uma estratégia delineada ao pormenor.

Representando cerca de 15% dos ruandeses, os tutsis foram favorecidos pelos colonizadores belgas e dominaram até à independência em 1962. Depois, os hutus procuraram sempre controlar o poder, tendo de enfrentar no início da década de 1990 uma guerrilha tutsi que os desafiava e foi essa guerrilha que depois (da matança) conseguiu derrotar os genocidas.

Neste livro, o jornalista e repórter de guerra Jean Hatzfeld, dá a palavra a um conjunto de assassinos hutus que tentaram exterminar os seus compatriotas tutsis. E são os mecanismos deste genocídio que o autor nos revela. São os relatos sobre o que se passou na cabeça dos homicidas durante as poucas semanas em que decorreu o genocídio.

Em depoimentos alucinantes, nas suas próprias palavras, homens vulgares contam a banalidade de um impensável horror, confrontando o leitor com a inexplicável violência de que o ser humano é capaz.

Estes depoimentos foram recolhidos na prisão, procurando o autor as raízes desse genocídio nas palavras dos executantes do crime. Já condenados e nada tendo a perder estes falam livremente das razões que os levaram a matar de forma sistemática, um a um, os vizinhos, os antigos colegas de escola, aqueles com quem partilhavam o trabalho e inclusivamente a mesma religião católica.

Uma lição de história sobre a barbárie que decorreu no nosso tempo.

Um livro alucinante. 


   Jean Hatzfeld, de retour au Rwanda aux côtés d' Engelbert - A l ...



Anotei:

(pg. 164)  -  há actos por causa dos quais somos condecorados, e formos os vencedores, e enviados para o cadafalso, se formos os vencidos.


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sexta-feira, 3 de abril de 2020

"ALGUMAS DISTRACÇÕES" - FRANCISCO JOSÉ VIEGAS - LEITURAS 2020 - IX


Algumas Distracções - Livro - WOOK


Francisco José Viegas é o actual director da revista LER.
É jornalista, colunista de diversos jornais e revistas.
É um homem culto, escreve bem e eu gosto de o ler.

"ALGUMAS DISTRACCÕES" é uma colectânea de textos provenientes dos blogs AVIZ, entretanto encerrado, e A ORIGEM DAS ESPÉCIES.

São pequenos (e atraentes) textos de coisas gerais, por ordem alfabética de acordo com o tema abordado, seja matéria literária, política, futebol ou outras distracções quotidianas. 

Interessante, fácil de ler e, sobretudo, fala de muita coisa, isto apesar de alguns temas, nomeadamente do futebol, poderem estar ultrapassados e certamente só do gosto de quem se interessa pelas coisas da bola.

Dentre muitos outros fala-se de Álvaro Cunhal, Apito Dourado, Arrastão de Carcavelos, Barry White, Cavaco, Cesariny, Dinis Machado, Einstein, Figo, Gerações, Harold Bloom, Idiotas, James Joyce, Laranja Mecânica, Naide Gomes, Optimismo e muitos mais assuntos interessantes. 

Crónicas de Francisco José Viegas: Maio 2007
 
Li e anotei:

(pg. 92)  -  Há uma diferença entre conhecimento e informação. 


(p.191)  -  compreender não é concordar, tal como discordar não significa não compreender.



3,5 - interessante

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sexta-feira, 27 de março de 2020

"O ESCAFANDRO E A BORBOLETA" - JEAN-DOMINIQUE BAUBY - LEITURAS 2020 - VIII


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Um livro escrito com os olhos.

No dia 8 de Dezembro de 1995, um acidente vascular mergulhou Jean-Dominique Bauby num estado de coma profundo. Quando dele emergiu, todas as suas funções motoras se haviam deteriorado, pois fora atingido por aquilo a que a Medicina chama "locked-in syndrom" (literalmente: fechado no interior de si próprio), ficando por isso totalmente paralisado, e só o seu cérebro e a sua pálpebra esquerda eram excepção ficando assim condenado a viver como um vegetal.

Sabia-se que o seu cérebro estava intacto, mas os médicos não acreditavam que um dia fosse possível que ele estabelecesse qualquer tipo de comunicação minimamente elaborada com o exterior.

E inicialmente, apenas o ensinaram a dizer sim e não com a pálpebra —uma piscadela queria dizer "sim", duas "não"—

Um dia, uma ortofonista (especialista em métodos de reeducação verbal e da voz) olhou bem para ele e para os seus movimentos com a pálpebra esquerda. E percebeu que seria possível estabelecer, com relativa facilidade. um contacto inteligente.
E com a ajuda de um alfabeto especial (conhecido em França com o nome de ERSATUIL) e através de 200 mil piscadelas de olho escreveram um livro que é uma reflexão sobre a vida. 

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Um livro que nos descreve o que só ele via o que só ele ouvia, as pessoas que dele tratavam, o enfermeiro que lhe apagava a televisão a meio de um jogo de futebol do seu clube que seguia com todo o fervor, os comentários do enfermeiro que entrava no quarto como se ninguém lá tivesse, o que lhe dizia bom dia sempre com o mesmo tom e sempre sem o ver...

Quatro dias depois do início da distribuição do livro, o jornalista Jean-Dominique Bauby, faleceu aos 45 anos de idade.

Na altura da morte do autor desta obra, o jornalista Daniel Ribeiro correspondente do jornal Expresso em Paris, escreveu: 
Até ao dia em que sofreu o derrame que o paralisou, Jean-Dominique Bauby era um homem de acção. Andava de moto, frequentava os circuitos da Formula 1, conduzia a alta velocidade e, mundano, bebia e gostava de conversar e de frequentar bares na moda. Adorava Paris e Nova Iorque e florestas tropicais. Era chefe de redacção da revista "Elle" desde 1994. Antes, tinha sido jornalista no "Combat" e no "Quotidien de Paris", chefe de redacção do "Matin de Paris" e editor da secção cultural do "Paris Match".

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Jean-Dominique Bauby com os filhos

 -sublinhei: 

- (da pág. 137) - As portas do BMW fecham-se suavemente. Disseram-me um dia que os bons carros se reconhecem pela qualidade desse som.



3,5 - interessante

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2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
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6 - excelente
7 - obra prima


sábado, 21 de março de 2020

"DIÁRIO DE ANNE FRANK" - LEITURAS 2020 - VII

diarioannefrankxs


Este é um dos livros mais lidos de sempre, sobre a tragédia da jovem judia holandesa que, entre 1942 (tinha então 13 anos) e 1944, foi acolhida, com a família, num sótão e que deixou os seus pensamentos escritos neste diário, em que regista os últimos 14 meses de tormento vividos com os pais e a irmã mais velha num anexo clandestino de Amesterdão, às escondidas das autoridades hitlerianas.

O esconderijo foi descoberto por denúncia, só que nunca se apurou ao certo quem foi o autor da denúncia que levou à descoberta do refúgio. Recentemente um estudioso sobre Anne Frank sustenta que o denunciante terá sido um sócio de Otto Frank, o pai de Anne. Mas outros historiadores aventam outros nomes.

Anne Frank e os restantes sete "mergulhados" (assim se chamavam aos que se mantinham escondidos da fúria nazi) foram descobertos e enviados para campos de concentração. O pai sobreviveu mas Anne e sua irmã morreram em Março de 1945 no campo de concentração de Bergen-Belsen (norte da Alemanha), dois meses antes da libertação da Holanda.

Já havia lido este livro há mais de dez anos e é um livro que toda a gente deveria ler. 

É um livro importante!

Resultado de imagem para diário de anne Frank


-sublinhei: 

- (da pág. 12) - As lágrimas humanas são as mesmas em todos os seres humanos e em todas as partes do mundo

- (da pág. 115) - É sempre melhor não adiar o que tem de se dizer


4 - bom

0 - li, mas foi zero
1 - desisti
2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
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4 - bom
5 - muito bom
6 - excelente
7 - obra prima

quarta-feira, 11 de março de 2020

"LIVRARIAS" - JORGE CARRIÓN - LEITURAS 2020 - VI

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Uma pequena viagem pelas maiores e mais antigas livrarias do mundo.

Por exemplo, a mais antiga de Itália, a LIBRERIA BOZZI foi fundada em 1810 e continua aberta, o seu primeiro proprietário foi um sobrevivente da Revolução Francesa, chamava-se António Beuf.

A mais antiga do mundo é, segundo o Record Guiness, a Livraria Bertrand, em Lisboa. 

A Livraria Lello, do Porto, cujas origens remontam a 1881, foi fundada com o nome Livraria Internacional de Ernesto Chardron, na Rua dos Clérigos, foi depois rebaptizada como Sociedade José Pinto Sousa Lello & Irmão, estabelecendo-se na Rua do Almada. Finalmente em 1906, a livraria receberia o seu nome definitivo, Livraria Lello & Irmão, com a construção do edifício actual —entre neogótico e art deco—

                                                     Livraria Lello - Porto


Resultado de imagem para livraria lello portoLivraria Lello, Porto, Portugal - #oporto #porto #portugal #lello A Livraria Lello é considerada uma das livrarias mais bonitas do mundo.  Já visitei várias vezes a cada visita à cidade do Porto.  Nesta última visita, fiquei surpreendido com a notícia de que a entrada era paga.  O preço da entrada pode, no entanto, ser deduzido do preço da compra de qualquer livro.  A Livraria Lello é considerada uma das livrarias mais bonitas do mundo.  Eu o visitei várias vezes toda vez que visito o Porto.  Nesta última visita, fiquei surpreso com a notícia de que a entrada foi paga.  O preço do bilhete pode, no entanto, ser deduzido do preço da compra de qualquer livro.


Num misto de ensaio e livro de viagens, Jorge Carrión cria uma possível cronologia do desenvolvimento das livrarias e do que elas representam, não apenas como actividade económica mas sobretudo como mitos culturais, centros de tertúlia e de debate político, ou lugares para a troca de ideias e refúgio dos solitários.

Nestas páginas nomes míticos desfilam como emblemas da melancolia e de conforto, como a Bertrand do Chiado lisboeta, as parisienses La Hune ou a mítica Shakespeare & Co., Lello (Porto), entre muitas outras.

                               Livraria Bertrand - Lisboa - a mais antiga do mundo  (1732)








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Motivado pelo tema, esperava eu que fosse uma viagem fascinante ao coração dos livros mas devo confessar que, talvez porque as minhas expectativas eram muito altas, senti alguma frustração pois o livro será, talvez, demasiado condensado e, na minha modesta opinião, pouco esclarecedor (por vezes até maçador), e, repito, se as minhas expectativas eram altas...talvez daí esta pequena desilusão. 

Em bom português, e o Jorge Carrión que me perdoe, mas aqui talvez o autor tenha tido mais olhos que barriga...   



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Jorge Carrión - n. Tarragona-Espanha-1976

 Li e retive: 

 - (pg.76) - Oscar Wilde morreu na capital francesa, sumido na indigência


- (pg. 225) - A FNAC nasceu em 1954 como uma espécie  de clube literário de espírito socialista


- (pg. 233) - A primeira edição da Reader's Digest saiu em Fevereiro de 1922


- (pg. 262) - A Ler Devagar é, actualmente, a livraria com mais livros em Portugal





2 - li, mas não me cativou

0 - li, mas foi zero
1 - desisti
2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
5 - muito bom
6 - excelente

7 - obra prima

quarta-feira, 4 de março de 2020

"UMA ABELHA NA CHUVA" - CARLOS DE OLIVEIRA - LEITURAS 2020 - V

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"UMA ABELHA NA CHUVA" é o nº. 13 da nova Colecção Miniatura dos Livros do Brasil e foi o último volume publicado desta interessante e bonita colecção. 

Sei lá há quantos anos ando para ler este livro de Carlos de Oliveira, que nasceu em Belém do Pará, filho de pais portugueses emigrados no Brasil. Tinha apenas dois anos quando a família regressou a Portugal.

Um bom livro que nos conta a história de Álvaro Silvestre que vive um casamento falhado e estéril, gerado pela conveniência de antigos interesses familiares, na pequena aldeia de Montouro, espaço provinciano onde todas as biografias se cruzam, se intrometem umas nas outras. 

Num Outono chuvoso e lamacento, as vidas dos protagonistas de uma "Abelha na Chuva" afundam-se num ciclo trágico de mentiras, vingança e amores frustrados, que põe a nu a estrutura social de um Portugal pobre, desamparado, do século XX. 

Lançada em 1953, esta é uma obra incontornável do neorealismo português e um livro que li com muito interesse.




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Carlos de Oliveira - Belém do Pará-Brasil- 1921-1981


-sublinhei (da pág. 31): - Se as orações dos cães chegassem ao céu choviam ossos



4 - bom

0 - li, mas foi zero
1 - desisti
2 - li, mas não me cativou
3 - razoável
3,5 - interessante
4 - bom
5 - muito bom
6 - excelente
7 - obra prima